Possibilidades de Julgamento de Improcedência de uma Ação Civil Pública por Desmatamento de acordo com a Jurisprudência recente do STJ
Neste texto, discutiremos as possibilidades de julgamento de improcedência, bem como apresentaremos uma jurisprudência recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) relacionada ao tema.
As ações civis públicas desempenham um papel importante na proteção do meio ambiente, especialmente quando se trata de casos de desmatamento. No entanto, é essencial compreender que existem situações em que uma ação civil pública por desmatamento pode ser julgada improcedente.
Fundamentos da ação civil pública por desmatamento:
A ação civil pública por desmatamento tem como objetivo principal a proteção do meio ambiente, buscando responsabilizar os envolvidos nas práticas ilegais de desmatamento e promover a recuperação das áreas degradadas.
Essas ações são baseadas em fundamentos legais sólidos, como a Constituição Federal, o Código Florestal e leis ambientais específicas.
Possibilidades de julgamento de improcedência
Embora a ação civil pública por desmatamento seja uma ferramenta importante na preservação ambiental, existem situações em que o julgamento de improcedência devem ocorrer.
Alguns cenários que podem levar a essa decisão incluem:
Falta de provas suficientes: Para que uma ação civil pública seja procedente, é necessário apresentar provas robustas e suficientes que demonstrem o desmatamento ilegal e a responsabilidade dos réus. Caso não haja provas adequadas ou existam dúvidas significativas, o julgamento de improcedência pode ocorrer por falta de fundamentação adequada.
Ausência de legitimidade ativa: A legitimidade para propor uma ação civil pública é restrita a determinadas entidades e órgãos públicos, como o Ministério Público e as associações ambientais. Se a parte que ingressou com a ação não possuir a devida legitimidade ativa, o julgamento de improcedência pode ocorrer em razão da ilegitimidade da parte autora.
Inexistência de dano ambiental: Em alguns casos, mesmo que haja desmatamento, pode-se argumentar que o impacto ambiental é mínimo ou inexistente, o que pode levar ao julgamento de improcedência da ação. É importante ressaltar que a avaliação do dano ambiental é um aspecto fundamental para o deslinde do processo.
Vale destacar aqui, caso julgado pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) em que entendeu pela improcedência do requerimento do ministério público, o qual solicitou a condenação do réu em obrigação de reparar e indenizar pelo dano ambiental. Vejamos:
A jurisprudência também respalda a ideia de que a recomposição natural do dano pode levar à improcedência da Ação Civil Pública. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em um agravo em recurso especial, afirmou o seguinte:
A cumulação de pedido de indenização por danos ambientais e obrigação de reparar a área degradada não é obrigatória, devendo ser observado o caso concreto. Se a restauração in natura de área de preservação permanente degradada se mostrar suficiente à recomposição integral do dano causado por desmatamento, não é necessária a condenação do agente poluidor ao pagamento de indenização por danos ambientais (STJ – Agravo em Recurso Especial – 2022/0103100-0, Relator: MIN. HERMAN BENJAMIN, Data de Publicação: 23/09/2022).
Nesse contexto, é interessante destacar uma citação relevante da jurisprudência atual, oriunda do Superior Tribunal de Justiça (STJ) no Agravo em Recurso Especial – 2022/0145786-8, relatada pelo Ministro Humberto Martins e publicada em 17 de outubro de 2022. A citação é a seguinte:
Desse modo, em que pese a comprovação do desmatamento ambiental, não há provas de que tais atividades, por si sós, ensejaram ofensa ao sentimento difuso ou coletivo ou redução da qualidade de vida da população local. Ademais, para casos tais, em que a atividade apresenta reduzida extensão, como acima constou da jurisprudência, tem essa Corte assentado que não se justifica a condenação em danos morais ambientais coletivos.
É fundamental destacar que cada caso de desmatamento é único, e as circunstâncias e provas apresentadas devem ser avaliadas de forma criteriosa pelos juízes responsáveis.
O julgamento de improcedência não significa necessariamente que o desmatamento não ocorreu ou que não haja responsabilidade envolvida, mas sim que as evidências apresentadas não foram suficientes para comprovar a procedência da ação civil pública.
Vale destacar aqui, caso julgado pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) em que julgou improcedente o requerimento do ministério público, o qual solicitou a condenação do réu por desmatamento de vegetação nativa no Cerrado. Vejamos:
Nota-se que, entre a constatação do dano (21/10/2010) e a data da nova vistoria (07/02/2018) passaram-se quase 08 (oito) anos, tendo a sentença, frente à constatação de ausência de danos ambientais no local, julgado improcedentes os pedido iniciais.(…) Na espécie, a vistoria realizada no local realizada após quase 8 (oito) anos da data da lavratura do auto de infração concluiu que a área já estava em recuperação natural, em virtude da paralização das práticas ilegais, assim sendo desnecessária a condenação do poluidor em complementar o dano com uma indenização pecuniária.
Observa-se que, para afastar a condenação ao pagamento de indenização, o colegiado estadual baseou-se em uma tese jurídica – de que, uma vez comprovada a recuperação in natura da área desmatada, não se revela cabível a condenação pecuniária. O recorrente, por seu turno, não impugna o grau de recomposição ambiental alcançado (matéria de fato), limitando-se a questionar, em abstrato, se a renegação natural do meio ambiente degradado, num período de oito anos, esgota a tutela reparatória ambiental (matéria de direito). Assim, infere-se que a pretensão recursal não demanda o revolvimento de fatos e provas, mas sim a correta interpretação dos arts. 4º, VII e 14, § 1º, da Lei 6.938/1981 frente a fatos incontroversos. Cuidam os autos de ação civil pública proposta com o fito de obter responsabilização por danos ambientais causados pelo desmatamento de vegetação nativa (Cerrado). (AREsp n. 2.104.861, Ministro Herman Benjamin, DJe de 23/09/2022.)
Do mesmo modo, em outro caso Parecido, dessa vez com o entendimento do TRF5:
Quanto ao mérito, nos termos do acórdão recorrido, o Tribunal de origem assim se manifestou: Na hipótese sub judice, remanesce incontroverso o fato de que houve o desmatamento informado na exordial, o qual foi ocasionado pelo demandado, conforme se infere do teor do boletim de ocorrência de f.05/07, assim como do auto de infração de f. 08/09 o que, na esteira nas considerações acima apresentadas, enseja a responsabilização objetiva do requerido. No entanto restou constatado, por meio da prova pericial realizada em juízo, que a área afetada pelo desmatamento promovido pelo réu, além de não se tratar de área de preservação permanente, já foi integralmente recuperada (…).(…)Registre-se, ademais, que não existe nos autos, qualquer indicativo de que o aludido desmate tenha ensejado danos adjacentes, insuscetíveis de recuperação ou prejuízos à fauna e à população local. Diante desse cenário, reputo prejudicada a pretensão de condenação do réu à reparação dos danos, assim como ausentes os pressupostos autorizadores da indenização por danos causados ao meio ambiente e a terceiros, em consonância ao posicionamento do colendo STJ.(…)Desta feita, deve ser mantida a improcedência da pretensão reparatária e indenizatória (fls. 87/90 ).12. Como se vê, a Corte local, com base nos elementos probatórios dos autos, concluiu ser indevida a indenização, porque houve reparação integral e espontânea do dano causado ao meio ambiente, e não se observou danos irreparáveis e prejuízos à fauna bem como à população da localidade. (STJ – Agravo em Recurso Especial – 2022/0032469-3, Relator: DES. MANOEL ERHARDT ( CONVOCADO DO TRF5), Data de Publicação: 26/08/2022)
Nos casos de ação civil pública por desmatamento, é garantido o direito à ampla defesa e ao contraditório aos réus envolvidos.
Isso significa que eles têm o direito de apresentar sua versão dos fatos, contestar as provas e argumentos apresentados pela parte autora e contar com a devida análise dessas informações pelo judiciário.
É necessário que todas as partes tenham a oportunidade de se manifestar adequadamente durante o processo judicial.
Em caso de impossibilidade de julgamento improcedente da demanda, a parte pode visualizar outras alternativas menos prejudiciais, por meio de acordos, termos de ajustamento de conduta, outras medidas de reparação ou compensação ambiental.
Essas soluções podem ajudar a mitigar os impactos ambientais e buscar um equilíbrio entre a preservação ambiental e os interesses dos envolvidos.
Conclusão
A jurisprudência tem se posicionado de forma sensível e cautelosa em relação à caracterização do dano coletivo.
Ainda que seja fundamental a proteção do meio ambiente e a responsabilização dos agentes causadores de danos, é necessário que as condenações e indenizações sejam embasadas em elementos sólidos e consistentes, evitando-se decisões arbitrárias ou injustas.
Embora a ação civil pública por desmatamento seja uma importante ferramenta na proteção do meio ambiente, é possível que, em alguns casos, ela seja julgada improcedente.
Isso pode ocorrer devido à falta de provas suficientes, à ausência de legitimidade ativa ou à inexistência de dano ambiental comprovado. É essencial que haja uma análise criteriosa das provas e das circunstâncias específicas de cada caso.
A jurisprudência recente do STJ reforça a importância da comprovação do dano ambiental alegado. Além disso, é necessário garantir o direito à ampla defesa e ao contraditório às partes envolvidas.
Mesmo em casos de julgamento de improcedência, podem ser buscadas soluções alternativas para lidar com a questão ambiental, visando à proteção do meio ambiente e à busca por equilíbrio entre os interesses envolvidos.
Advogado e Professor especialista em Direito Ambiental pela Escola Verbo Jurídico, e em Direito Agrário e do Agronegócio, pela FMP – Fundação Escola Superior do Ministério Público. Sócio-fundador e CEO do escritório MartinsZanchet Inteligência Ambiental Para Negócios. Como Advogado Ambiental, tem sua expertise voltada para Responsabilidade Civil Ambiental. Sócio-fundador da Escola de Direito Ambiental. Sócio-fundador do Canal no YouTube e Podcast Inteligência Ambiental, maior canal do Brasil sobre a matéria de Direito Ambiental. Membro da União Brasileira de Advogados Ambientais (UBAA). Autor de diversos artigos, dentre eles “Responsabilidade Civil Ambiental: as dificuldades em se comprovar o nexo causal”.
Tiago Martins
OAB/PA 19.557 || OAB/SC 68.826-A || OAB/SP 518418
Advogado e Professor de Direito Ambiental com maior atuação no contencioso cível, administrativo e penal ambiental, além de prestar consultoria e assessoria ambiental. É Mestre em Direito e Desenvolvimento Sustentável: Direito e Políticas Públicas pelo Centro Universitário do Pará – Belém. Especialista em Direito Público com Ênfase em Gestão Pública e Capacitação para o Magistério Superior pelo IBMEC São Paulo. Conselheiro Seccional Suplente – OAB/PA. Conselheiro Suplente no Conselho de Desenvolvimento Urbano de Belém/PA. Professor Universitário de Graduação e Pós-Graduação, focado em Direito Ambiental, Direito Administrativo e Direito Constitucional. Sócio-fundador da Escola de Direito Ambiental. Sócio-fundador do Canal no YouTube e Podcast Inteligência Ambiental, maior canal do Brasil sobre Direito Ambiental. Professor em preparatórios para concursos públicos e exame de ordem, com foco em Direito Ambiental e Ética Profissional. Membro da União Brasileira de Advogados Ambientais (UBAA).
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